quinta-feira, outubro 26, 2006

O pai



Inaldo nasceu num bairro pobre do Rio de Janeiro. Somente aos dez anos entrou na escola. Aprendeu a ler e escrever e não parou mais. Virou jornalista. Casou com uma bela mulher. Teve com ela um filho. Eram felizes.

Um belo dia sua companheira o deixou. Assim, sem mais nem menos, sem menos nem quê, levando consigo o rebento. Inaldo entrou em parafuso. Pensou em largar tudo. Não tinha família, não tinha amigos, não tinha ninguém.

Não se sabe como, Inaldo prosseguiu lutando. Não tivera mais notícias da mulher ou do filho. Colocou toda a sua vida em seu trabalho. Entrava às oito e saía as dez da noite. Escrevia, perguntava, apurava, escrevia mais, entrevistava, argumentava, enlouquecia as fontes, que para ele, não tinham vida, como ele.

Passaram-se trinta anos. Inaldo fez 70, e nenhuma menção de parar. Um belo dia, entre entrevistas, argumentos, contra-argumentos, questionamentos, se deparou com um jovem jornalista, um foca. Aquele olhar não lhe era estranho. Não tirava os olhos do rapaz, que percebendo, se sentiu incomodado, foi tirar satisfações.

- o que foi velho, nunca me viu - indagou

Inaldo silenciou. Sentou-se, sem tirar os olhos do rapaz. E ali dormiu o sono eterno. O rapaz, se sentindo mal, foi investigar. E descobriu que Inaldo tivera uma mulher e um filho, que o abandonaram. Esse filho, no entanto, morreu. Viu sua foto. Era idêntico a ele.

Possivelmente, o velho havia morrido achando que havia reencontrado o filho, mas na verdade era apenas um sósia. Por isso, a partir daquele dia, assumiu a identidade do filho morto de Inaldo, aogra também morto. Foi ter com sua nova família. E enlouqueceu. Morreu no hospício anos mais tarde. Sem saber bem quem era. Mas sabendo que havia encontrado um pai que nunca teve.